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  • Foto do escritorJoão Correia Gomes

DESMATERIALIZAÇÃO NO IMOBILIÁRIO: OBTER MAIS, MAS COM MENOS?!


O imobiliário tem, explicitamente, uma índole material que exige um alto consumo energético e provoca elevada pegada ecológica sobre a superfície do planeta. A sua importância em qualquer economia é enorme, senão preponderante.

Claro que a dimensão do imobiliário não pode ser medida apenas no peso no Produto Interno Bruto (PIB). A sua real dimensão abrange os espaços e ambientes necessários para a humanidade funcionar em qualquer vertente, para suportar civilizações e não o caos.

Não é apenas habitação, escritórios ou retalho. São os espaços urbanos, rurais e naturais transformados para criar valor na percepção humana, o que significa em sobrevivência, felicidade, motivação, preservação e continuidade.


Na abordagem mais tradicional, o negócio foca-se sobretudo na ocupação do solo natural para urbanizar, na construção civil e na posterior venda de imóveis. Estas são atividades com forte índole física e presencial humana.

A ótica corrente privilegia mais o lucro imediato do que criar valor no longo prazo e ampliar benefícios a mais utentes. O fim do imobiliário, expresso em edifícios ou em infraestruturas, afeta em escala relevante toda a superfície do planeta quando impermeabiliza, contamina e o tornam estéril. Para bem da humanidade, exige-se processos sustentáveis para conferir um futuro para todos, inclusive não humanos.

O imobiliário (inclui atividades como o turismo) e a construção contribuem demais para toda a economia com um dos maiores pesos no PIB. Esta contabilização inclui o consumo de materiais fósseis e inertes do subsolo para a produção de aço, cimento, tijolos, plásticos, além de outros.

Na forma mais tradicional, os processos de construção dependem ainda muito do esforço muscular e da ação imediata no terreno (estaleiro) sem grande planeamento e informação. Este modelo tem baixa eficiência, gera assim menor produtividade e salários. Este modelo de negócio tradicional teve sucesso nas últimas décadas porque beneficiou de várias condições que se interrelacionam, mas são cada vez menos habituais, como sejam:

  • Com processos de construção pouco eficientes, mas muito destruidores, conseguem ser competitivos em economias fechadas, com habitantes condicionados ao território;

  • A procura baseia-se em população afluente com baixa formação, logo pouco exigente, que se fixa nos grandes centros, mas com ocupações remuneradas estáveis;

  • A Banca tem confiança (condição fundamental) para financiar quer a aquisição de habitação pela população como a construção de edifícios a montante;

  • Com mão de obra e crédito abundantes, o negócio de construção para venda é acessível a quem for ambicioso, mesmo que não tenha conhecimento de imobiliário;

  • Os processos não precisavam de ser racionalizados pois o produto vende sempre, sendo mais fácil cortar nos custos, mesmo gerando desperdício e menos qualidade.

O mundo atual é diferente do passado quando menos humanos interferiam na natureza, mas também eram menos cientes dos limites desta com conhecimento mais limitado.

O presente e o futuro exigem soluções diferentes do passado conforme sublinhei no último artigo publicado. Por exemplo, a população portuguesa está a perder juventude, e é esta que mais compra casa. Os jovens que não emigram, e ficam no território, não têm salário suficiente e estável para comprar casa logo não geram confiança para beneficiar de crédito.

Aqueles que têm melhor formação e facilidade na língua inglesa não se prendem ao país como acontecia no passado. Ficam os mais acomodados e menos ambiciosos que tendem a aceitar salários baixos e os empregos instáveis disponíveis, sujeitando-se a viver na casa dos pais (exceto as poucas exceções que não fazem a realidade). Os imigrantes que entram no país não ocupam as posições necessárias, que exigem maior formação, mas antes os trabalhos que os portugueses não procuram.


A economia morre e, em breve, deixará de sustentar os dependentes do Estado, como os crescentes pensionista e funcionários públicos.

Não existe mais a mão de obra barata e abundante, exceto se for através da imigração, mas esta tem baixa formação, logo a produtividade não deverá ser elevada. Mesmo os processos de construção tradicionais baseados no esforço muscular para edificação de baixa qualidade estrutural em que se ilude com acabamentos da moda para vender a quem só vê a aparência, são cada vez mais caros. É o que se vê. São poucas as exceções neste mercado.

Para evitar o desastre social e económico subjacente é necessário mudar todo o paradigma do processo de negócio. A missão do setor deveria ser o fornecimento e geração de ambientes para todas as atividades humanas. Os processos económicos que geram hoje mais riqueza não são aqueles que focam o corte (cego) nos custos (modelo ainda usual em Portugal).

Num contexto mundial, já nem são sequer as estratégias que focam na produtividade ou automação, embora estes ainda prevaleçam nas economias mais prósperas como a alemã ou sul-coreana.

Os negócios mais prósperos focam primeiro virtualmente os seus processos antes de abordarem a realidade. Esta tende a ser mais onerosa e com consequências irreversíveis. Interessa analisar os fluxos do processo (workflows) para descobrir erros e constrangimentos como a abordagem “Throughput” (Mulvenna, 2022).


A informação é o meio mais fluído e rápido em que se baseiam quase todos os processos, sobretudo pela Internet e Inteligência Artificial. Neste âmbito integram-se disciplinas como gestão, investimento, marketing, engenharia, arquitetura, digitalização. Privilegia-se a inteligência e o conhecimento em relação ao trabalho físico que pode ser efetuado por máquinas em processos instalados em paralelo. No entanto, para esta via, requer-se a mudança de paradigma de negócio.


Observando melhor a criação de valor em imobiliário, a melhor razão económica não estará tanto na acumulação (de capital ou de áreas de construção nova) pois tal critério implica a exploração em contínuo e sem recuperação de recursos escassos apenas para produzir bens, vendê-los e contaminar o ambiente sem o recuperar nem consequências. Um processo económico sempre em aceleração e crescimento exponencial quando o único planeta disponível é limitado em recursos materiais e capacidade ecológica. As consequências serão a estagnação da economia e do ecossistema. Depois a extinção da humanidade, envenenada.



Na ótica de longo prazo, o valor criado deriva mais da diferença entre as curvas de rendimento gerado e dos recursos necessários, devidamente ajustados no tempo para um referencial com uma taxa adequada. O que interessa é o diferencial entre as duas curvas, o tempo e taxa!


Neste princípio, para otimizar valor em imobiliário não passa por produzir cada vez mais, sobretudo projetos de imóveis novos. Estes consomem demasiados recursos físicos apesar de maximizar o preço de venda. Porém, é uma solução cada vez menos sustentável e está a afastar a grande massa de potenciais utentes, sobretudo jovens. Como os custos do solo urbano e de construção são elevados (além do licenciamento e fiscalidade) o único produto viável tende a ser o destinado ao luxo para segmentos superiores a média alta.

Na prática, são residências e hotéis que vendem os ambientes naturais e humanos naturalmente disponíveis na envolvente publica. São produtos muito restritos para mercados exigentes, pois dependentes de fatores subjetivos como o gosto, emoções, moda. O risco fica assim muito elevado, o qual não com frequência avaliado.

Depois, a produção exige recursos exclusivos com elevado custo. Face ao risco, o custo de capital, o tempo de escoamento, o diferencial acima referido, quando atualizado com a taxa adequada e correta, pode não ser assim tão otimizado. Pode não passar de ilusão!


Podem colocar-se outras alternativas de conceito imobiliário. Interessa então focar segmentos de mercado que são muito mais vastos, e até menos exigentes, com necessidades prementes, logo dispostos a bens ou serviços mais básicos apenas para obterem uma qualidade de vida mínima. Neste caso, olhando para a figura cima, o produto imobiliário poderia assentar num diferencial cuja curva de rendimento está em cota inferior.

Neste caso a curva de custos estaria numa cota em proporção inferior.

Como aconteceu no século XX pela produção industrializada de grandes séries repetidas, a pré-fabricação, a modulação, a automação dos processos de fabrico, e muito trabalho de cérebro (planeamento, gestão, arquitetura, engenharia). Para tal efeito existem cada vez mais ferramentas úteis de gestão de projeto como a Jira® e o IPD.


Melhor ainda, perante tantos edifícios antigos a requerer reabilitação, em vez de se demolirem para substituir por construção nova que finge ser reabilitado (tipo fachadismo). Uma solução poderia passar por intervenções mínimas em edifícios existentes, mantendo o princípio construtivo estrutural original (por exemplo, paredes de alvenaria resistente com elementos horizontais leves), substituindo apenas os elementos degradados com o mesmo princípio (pavimentos em madeira ou LSF) ou para melhorar as condições de conforto (como as caixilharias).

Quando se aproveita o edificado existente sem desperdiçar o material aplicado, nem a sua energia intrínseca, contamina-se menos o ambiente. Pelo contrário, aproveita-se, regenera-se, complementa-se, economiza-se em custos com novas estruturas que afetam o ambiente. Por aplicação do DCF, interessa menos a intervenção com custos a somar, mas sobretudo o valor final ajustado com atributos até intangíveis, mas que contribuem para maior percepção de valor como são os dinâmicos (caráter, História, originalidade, local).



O imóvel reabilitado pode não cumprir os requisitos exigidos a um imóvel novo, não tanto de betão armado. Os seus princípios construtivos são antigos, mas não deixam de ser válidos, apesar de diferentes. A maioria da população do mundo vive em imóveis antigos, mas preservados. É melhor reabilitar um imóvel antigo e proporcionar habitação a preços acessíveis do que exigir construção nova, mas cara e que nunca estará disponível.

Caso contrário a população continuará a viver em imóveis sem condições funcionais aceitáveis de alta degradação para derrocada em breve, ou longe do local de trabalho cujo trajeto diário a esgota em saúde, produtividade e felicidade, além do elevado consumo de combustível altamente taxado.


Por outro lado, o tempo de longo prazo tem elevada importância no valor, talvez interesse transformar o produto imobiliário para o vender em serviços de alojamento em rendimento, com base em capital disponível em veículos titularizados vendidos no mercado de capitais (mercado mais partilhado e eficiente).


Este tema é desenvolvido no livro “Uma nova visão sobre o Imobiliário”.


Lisboa, 12 de setembro de 2022


João Correia Gomes (Ph.D., Mestre em construção, Engenheiro civil)


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