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  • Foto do escritorJoão Correia Gomes

AVALIAÇÃO IMOBILIÁRIA, IR AINDA MAIS ALÉM

Atualizado: 28 de dez. de 2020


Um pouco de História


A avaliação imobiliária foi evoluindo com metodologias que se adequavam aos requisitos económicos dominantes nos contextos socioeconómicos a que servia.

Durante séculos, e ainda hoje nas sociedades menos desenvolvidas, o domínio absoluto foi da atividade agrícola, florestal e pecuária como base da produção económica. Então, a riqueza media-se mais pela posse da propriedade imobiliária, fosse de terra produtiva ou do edificado. A remuneração provinha da exploração direta ou do arrendamento a terceiros. A transação imobiliária de bens imóveis não era comum. Pelo contrário, era rara. As transações mais correntes tinham origem na herança ou por casamento.


Para esses vários fins, também era necessário avaliar para as propriedades imobiliárias. A metodologia corrente processava-se pela contagem de unidades produtivas fosse em hectares, em número de árvores, cabeças de gado ou até servos ou escravos. Para avaliar o edificado, em construção tradicional muito empírica e muscular dominada por mestres, o valor focava no custo de produção em materiais e mão de obra.


Para o valor dominavam os fatores tangíveis, mensuráveis em quantidades como áreas de terreno ou construção, esta por custo integrado de materiais e mão de obra. O método de custo era o possível para funcionar neste contexto pouco dinâmico. Ainda hoje se mantém a metodologia de modo regular, talvez por tradição ou, quando muito, serve para comparar resultados de outros métodos e induzir decisões de investimento.

Como a remuneração depende da renda a terceiros, emerge então a metodologia ainda básica baseada no rendimento. Trata-se de metodologia de cálculo simplificada pela relação entre a renda e o valor patrimonial com uma certa base comparativa, mas não tão justificativa como atualmente é praticada.


Apenas na segunda metade do século XX as transações imobiliárias ganham relevância, sobretudo após instituição da propriedade horizontal e crédito hipotecário. A sociedade de mercado beneficia de milhões de indivíduos com estabilidade familiar e emprego, essencial para garantir aos bancos o bom pagamento de serviço da divida. A aquisição de casa própria aumenta. A banca financiava a produção e a aquisição pelo cliente final. Alimentava o crescimento do mercado e o aumento contínuo de preços de transação. Além da consolidação da banca e o fácil crescimento do PIB, este contexto de proprietários estabilizava a democracia, o que seduzia os governos em apostar no modelo de negócio. O arrendamento e outros conceitos eram prejudicados.


Todos estavam felizes com este mundo em crescimento, até que a ambição fragiliza o mercado e o modelo na crise do subprime. Até 2007 abundavam transações imobiliárias e operações de crédito hipotecário. Recentemente, alguns mercados estão a recuperar.

Neste contexto, para avaliação de imóveis em transação emerge o método comparativo ou de mercado. Para tanto crédito emergem cada vez mais avaliadores imobiliários. Estes aplicam mais ou menos bem a metodologia, mas a mesma exige dados fiáveis, reais, que não são disponíveis, pelo menos em alguns mercados (Portugal?).


Um admirável mundo novo


O atual paradigma socioeconómico criado a partir da segunda revolução industrial e segunda guerra mundial está a findar rapidamente. Não foram apenas as crises financeiras após 2008, mas é também a crise das alterações climáticas, a degradação do planeta, as migrações, a emergência dos populismos, a desigualdade e desagregação social e agora o Covid-19 que veio destapar todos os problemas que se escondiam. Apenas durará mais um pouco no curto prazo e sobretudo nas economias estagnadas porque não aceitam inovar, nem alterar o status-quo.

Desde sempre, a humanidade viveu crises e obrigou a mudança. Umas geram as outras. Se juntarmos outras revoluções como a quarta revolução industrial em curso; a mudança de preferências dos jovens (millennials) pela partilha em vez da posse, de viver experiências em vez da estabilidade da fixação; a crescente quebra de certos tipos de ocupação; então é quase certa a mudança próxima. Note-se que nas economias dinâmicas a mudança será radical e não apenas ajustamentos cosméticos. Apenas não se acendeu ainda o rastilho certo que levará à revolução da sociedade de mercado e a substituição dos modelos de negócio instituídos. Por enquanto, e como sempre foi no passado, os velhos “dinossáurios” do poder estão a segurar o que resta.

Não sei como será o novo mundo. Nem ninguém pode saber com certeza. O imobiliário continuará a ter muito peso na economia, mas não será com os mesmos ativos a que nos habituamos. Os sinais apontam que o mundo estável de pleno emprego estável para quase todos, e que sustentou o crédito e a transação de casas, já estará na espiral descendente. Este processo irá distinguir os países cada vez mais ricos daqueles que ficarão no caminho cada vez mais pobres.

O planeta também não aguenta tantas transações de bens, imobiliários ou outros. Este modelo económico esgota o planeta. E, quando este se esgotar, os humanos extinguir-se-ão, como os humanos irão extinguir a pandemia do Covid-19.

Com mais ou menos dor, mais ou menos destruição, o mundo terá um modelo social e económico que terá de partilhar mais e menos usar e deitar fora. Tudo se irá aproveitar numa economia circular que seremos obrigados a adotar. A mantra será produzir menos quantidade, mas com muito mais qualidade, ou seja, para servir e durar mais.


Na Europa rica, mas com população em envelhecimento acelerado e em decrescimento, a locomotiva da economia não será a construção de novos edifícios. Provavelmente, será a reabilitação do edificado existente, mas com baixo recurso a materiais poluidores e consumidores de energia como o cimento e o aço. Precisam-se de soluções de baixa energia e elevada regeneração. É possível que a biotecnologia entre e domine o setor da construção, talvez a partir da testada tecnologia da madeira como trampolim, mas a saltar para outras abordagens. A economia circular irá dominar.


O ativo imobiliário será cada vez mais entendido como uma plataforma para a instalação de serviços, a gerar cash-flows para remunerar os investidores e empreendedores no longo prazo. Os imóveis serão como seres vivos que se regeneram e adaptam a novos contextos ambientais (humanos, físicos, institucionais). A grande emergência será da Gestão Imobiliária nas suas variadas vertentes, desde o âmbito mais operacional junto do utilizador até ao âmbito mais estratégico do investidor.


Para a promoção imobiliária será cada vez menos relevante a produção “caseira” para venda local, mas o serviço prestado ao investidor-cliente que procura ter ativos na sua carteira diversificada. O investidor pode ser privado, mas terão cada vez mais peso os investidores institucionais que representam milhares ou milhões de participantes, regra geral pequenos investidores ou aforradores.


E o novo mundo?


Tal como no resto da economia, os modelos de negócio imobiliário irão mudar muito. Serão dominados por processos dinâmicos, com cadeias de ação e conta de exploração distintas e não comparáveis. O negócio imobiliário será dominado pela reabilitação de imóveis ou a sua exploração no longo prazo.

Exceto em economias estagnadas ou em decadência, o produto imobiliário padrão vigente irá mudar. Nas sociedades de mercado mais dinâmicas, o produto de construção de habitação com venda financiada pela banca irá perder importância, exceto em nichos como o mercado de luxo ou onde impera a especulação. Mas, para a economia crescer não pode depender de um nicho ou outro, mas atingir o grande mercado de massas. Nas economias mais pujantes impõe-se já o produto de imobiliário de exploração a longo prazo, com a implantação de negócios baseados na propriedade como plataforma de serviços. O produto padrão será substituído pelo processo padrão.


Os negócios baseados em imobiliário primam pela diversidade e originalidade. Não precisam de se limitar ao turismo, aos centros comerciais ou aos escritórios, os quais irão também sofrer alterações para sobreviverem. Os novos conceitos em emergência dependerão muito da criatividade e da inteligência adaptativa.


Um exemplo, refere-se ao suprimento de habitação acessível nos centros das cidades para famílias da classe média. Trata-se de complexos multifamiliares com venda de serviços, em que utiliza o elevado número de unidades para reduzir o custo por metro quadrado através de processos industriais e modulares. Outros exemplos de negócios baseados em imóveis serão o co-living, o co-housing, o co-working, as residências para idosos, as residências para estudantes, etc. Também é negócio imobiliário a exploração de parques e redes de produção de energia renovável, as quintas marítimas de produção de peixe, o negócio agroflorestal.


Como se adapta a avaliação imobiliária ao mundo emergente?


Os objetivos não serão tanto através da recuperação de capital investido acrescido de lucro na venda de bens imóveis. As transações de imobiliário serão sobretudo baseadas em títulos na bolsa ou mercado de capitais por milhões de pequenos investidores em todo o mundo.

Os interesses de um investidor de longo prazo focam-se não apenas na rendibilidade, mas também no risco (controlado) e no plano de saída. Os modelos de avaliação terão de se adaptar ao novo paradigma. Terá de crescer uma nova metodologia de avaliação. A comparação de valores de venda deixará de fazer sentido.


O novo avaliador terá de conhecer os vários modelos de negócio de exploração, como avaliar o risco (que não passa por aplicar uma “yield” que leu no jornal ou num relatório) para construir a taxa de atualização pertinente com o contexto do ativo imobiliário.



Este tema é desenvolvido no livro








Lisboa, 10 de dezembro de 2020


João Correia Gomes



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