Ter um PMO é o sonho de toda empresa que trabalha com projetos, é garantia de sucesso, correto? Discutimos nesse artigo que, na realidade, as coisas não são tão simples...
Porque não tem o comprometimento da alta liderança e porque a colaboração e o “senso de dono” são baixos na organização. Fim.
Assim como artigos acadêmicos, que já dão spoiler no Resumo, essa é a brilhantemente óbvia conclusão. Agora, caso você ainda tenha a curiosidade de saber como chegamos a esse desfecho, continue lendo este artigo.
Não que todo PMO falhe, não é isso o que se está dizendo aqui. Vamos nos referir aos PMOs (Project Management Offices) ou equivalentes que eventualmente venham a falhar – o que, convenhamos, é uma parte significativa se não a maioria. Esses são os casos abordados, a fim de entender o que acontece de forma racional e um tanto quanto pragmática.
É pelo começo que se começa
Para partir de alguma referência, O PMI (Project Management Institute) define três tipos: de suporte, de controle e diretivo, mas na prática as organizações não fazem nenhum desses. Estamos falando de PMO para empresas que “não-projetizadas”, mas que precisam de projetos como suporte para suas operações. Nelas, usualmente os projetos caem para equipes de engenharia ou de TI, entretanto o que se vê na verdade são agrupamentos de pessoas com conhecimentos técnicos não comuns ao negócio central da organização, que são demandados a resolver problemas igualmente incomuns. Forma-se uma ilha no meio da empresa, com escassas e difíceis comunicações. Indiferente a isso, os resultados precisam vir, sempre. Ora, isso não é um Escritório de Gerenciamento de Projetos (PMO), mas qualquer outra coisa, que serve bem para resolver problemas quando dá certo, e para pôr toda a culpa quando dá errado, convenientemente.
Antes mesmo do projeto se iniciar, a definição do problema é uma etapa essencial, e há diversas técnicas exemplares para isso. Quem solicita uma solução em forma de projeto muitas vezes sequer conhece bem seu problema! E assim nascem projetos que sequer tem chance de cumprir seus objetivos – uma “falha congênita”, por assim dizer – o que força os times de projetos a tomar decisões que, na verdade, deveriam ser inputs vindo da área operacional. Mas ninguém quer se comprometer, esquivando-se das implicações que se envolver em um projeto traz – triste, mas frequente.
Um projeto não começa na fase de Iniciação e termina na de Encerramento, simplesmente, pois é uma modificação no negócio da organização, essencialmente composto por operações, que por sua vez são compostas por processos. Se os processos e operações forem ruins, não é um bom projeto que vai salvar a pátria. As empresas deveriam focar primeiro em executar suas rotinas corretamente, para depois pensar em projetos, mas um projeto oferece a tentação da promessa de um atalho.
O ciclo inclui a fase de pré-projeto, que consiste na análise do negócio, definição do problema e vislumbre da solução desejada; na fase de projeto propriamente dita, desde o planejamento até a transferência; e na fase de operação, quando o produto do projeto está desempenhando e os benefícios são realizados. Parece que ultimamente todo o foco está só na etapa do meio, do projeto, e isso é um grande erro. Não adianta nada um projeto ser bem gerenciado se as fases anterior e posterior forem malfeitas.
A fase de pré-projeto é sofrível, ainda mais em tempos em que a pressa reina. A urgência é o padrão, e ninguém consegue dedicar o mínimo de tempo necessário para parar e pensar no problema. Sim, precisa primeiro parar para pensar. Até porque um problema pode ser uma oportunidade que todos estão deixando passar batido. Há amplo ferramental para isso, para todos os gostos, e o PMI tem até uma certificação dedicada a essa fase, o PMI-PBA (Professional in Business Analysis). Contudo, as pessoas querem pular direto para a solução sem nem saber qual é o problema.
A fase posterior ao projeto também é um problema, pois os responsáveis da área de negócios precisam se preparar e ser preparados para assumir a operação após o projeto. Na maioria dos projetos, a participação do usuário é mínima, e só ocorre na fase final, de transferência, quando percebe detalhes que não conhecia e se recusa a aceitar o projeto. Os benefícios acabam não sendo realizados; e benefício é o que paga as contas. O usuário precisa ser envolvido sistematicamente desde o início, a partir da ideia. Não fazer isso é erro de todo mundo, inclusive do gerente de projetos, mas a responsabilidade maior é do dono do negócio, que é quem solicita o projeto, contrata e paga.
Colaborar é preciso.
Em organizações não-projetizadas, o time de gestão projetos é apenas uma das diversas áreas de apoio, e recebe cobranças pragmáticas. Assim não funciona; ou todo mundo trabalha junto, ou a coisa não anda. Individualismo não funciona para projetos, pois não é algo que dá para fazer sozinho.
Projeto é algo complexo, demanda o entendimento comum dos envolvidos, sinergia, alinhamento conceitual, colaboração. A chefia precisa não só respaldar, mas agir de acordo e dar o exemplo. Não basta força de vontade, querer fazer, bater no peito e bancar uma de cowboy bradando que no final tudo vai dar certo. Existem métodos para se fazer projetos que, se não forem seguidos, o fracasso é quase certo. E dá errado mesmo, muito frequentemente, com muitos prejuízos. Saber trabalhar bem com projetos é cada vez mais uma questão de fazer a organização funcionar, pois cada vez mais mudanças, transformações e adaptações são necessárias, que só ocorrem por meio de projetos.
Trabalhar em projetos é algo essencialmente colaborativo, senão não funciona, mas é difícil trabalhar assim. O egocentrismo e o egoísmo ainda imperam, e as pessoas não são educadas para colaborar, mas para competir. Pegar um profissional com o ego inflado (especialmente se ocupa um alto cargo) e tentar mudar esse estigma é muito complicado. Os trilhamentos psicológicos já são tão profundos, que se envergar, arrisca quebrar.
Nós demoramos para esquecer e redescobrir os métodos de fazer as coisas acontecerem, até que ressurgiram com mil e um frameworks e abordagens diferentes, que no fundo são a mesma coisa: como sair do zero e chegar em seu objetivo. Hoje temos até o problema inverso à falta de metodologia organizada: há muitas “seitas” de gerenciamento que, ironicamente, mais se dividem do que colaboram umas com as outras. Tudo deveria convergir para uma grande caixa de ferramentas que resulte em um sistema inteligente de fazer a coisa acontecer de um jeito melhor, ajustado a cada tipo de situação, e pronto. O resto é, no fundo, apenas vaidade.
É preciso educar as pessoas para trabalhar em projetos, em equipe, colaborando, não só no sentido de prover conhecimentos e competências, mas também no de respeitar o processo de construção da solução e fazer parte dele. Ora, gerenciamento de projetos não é nada mais do que um jeito de fazer as coisas acontecerem – uma macroferramenta, digamos. É comum ver pessoas respeitando o processo de gerenciamento de projetos como alguém que dita uma carta ordenadamente? Infelizmente não, pois é preciso conhecer para saber usar.
Onde entra o PMO?
Quando o negócio central da organização não é a realização de projetos, mas projetos são necessários para implementação da estratégia, o PMO deveria atuar muito mais como um facilitador do que como executor. E isso vale para os três tipos de PMO, pois todos eles necessitam da participação das pessoas das demais áreas funcionais da empresa e de fora. Se atua nesse universo de alguma maneira, faz parte dele e precisa entrar no samba.
“Só” gerenciar bem os projetos não é o suficiente, quando as partes anterior e posterior não são bem-feitas. Se um trabalho que abrange toda a empresa não é feito satisfatoriamente, será que deveria sobrar para o PMO consertar? Já é bastante trabalho cuidar do portfólio, muitas vezes sem recursos e desacreditado pela liderança, e aí o PMO precisa abraçar o “antes” e o “depois” também? Talvez seja o modelo de governança que esteja errado. PMO implica em um bando de gente especializada em gestão de projetos que interage outros especializados no negócio e na operação, mas o que é mais difícil e demorado: aprender gerenciamento de projetos, ou negócios e operações? Não seria mais eficiente treinar as pessoas de negócio e operações em gestão de projetos, e manter um PMO com profissionais mais experientes dando suporte?
Talvez isso seja uma utopia, mas algo precisa ser feito. Que tal começar conhecendo e definindo bem o problema que cada área precisa resolver? Essa medida já vai resolver muita coisa.
Gerenciar ou não, eis a questão.
Gerenciamento de projetos é uma necessidade primária; sempre foi, e é simples entender o porquê. Qualquer coisa que se queira realizar, desde construir uma edificação a tratar uma doença, para ser bem sucedida de primeira, seja porque não haja uma segunda chance ou porque os recursos e tempo são escassos, demanda antecipação às necessidades e dificuldades, e isso é a essência do planejamento, que por sua vez é a pedra angular do gerenciamento de projetos.
Gerenciamento de projetos não é uma coisa nova, muito menos uma necessidade nova. Parece que temos a mania de compreender qualquer coisinha e achar que é uma baita descoberta, como uma criança que aprende uma palavra nova e fica repetindo-a pela semana inteira. Uma maneira de evoluir racionalmente o gerenciamento é começar a tratá-lo como algo natural, ao invés de ficar criando nomes e termos descolados para se promover. Quer fazer algo acontecer? Transforme isso em um projeto, e suas chances de sucesso dobram. Fez EAP (Estrutura Analítica de Projeto)? Triplicam. Desdobrou em um cronograma? Quadruplicam. Projetizar as coisas nada mais é que decompor um objetivo e transformá-lo em metas factíveis, de modo a facilitar seu atingimento, uma coisa de cada vez. Cada “coisa” que se faz de cada vez é um processo, e tudo são processos que se repetem, de modo que um projeto é um conjunto de processos típicos que, somados, o compõem com uma configuração sempre única. Esse é o cerne da coisa, e compreendido isso, o que existe ao redor são técnicas e ferramentas empregadas para facilitar a vida, apenas.
Se isso é algo assim tão importante e comum, por que então não se ensina os fundamentos do gerenciamento de projetos na escola? Talvez pelo mesmo motivo que não se ensine coisas também essenciais como dirigir, cuidar bem de suas finanças pessoais, cuidar da própria saúde, autodidatismo... só para citar alguns poucos exemplos. E talvez pela mesma razão que primeiro se ensina errado para depois, quem sabe um dia, lá na pós-graduação, corrigir – em física, química, matemática, história... mas não vamos adentrar essa seara hoje. É óbvio que essas coisas todas deveriam ser ensinadas desde cedo, e não só de modo individual, mas colaborativo.
Imediatismo: o novo mal do século?
Um indicativo claro de que alguém não manja de gerenciamento, e muito menos de projetos, é a noção de tempo em que quer colher os resultados. Tudo é para ontem, em uma atitude que simplesmente ignora o fato de que para algo sair bem feito, dispende tempo. E a maior quantidade de tempo necessária em um projeto é, sem dúvida, para reunir a cambada e fazer esse povo trabalhar junto. As pesquisas não me deixar mentir sozinho: o maior pepino dos projetos é a comunicação. Pode ter o sistema que for, mas se as pessoas não se comunicam de maneira efetiva, a coisa não anda direito. Isso tudo demanda tempo, e um tempo empregado de modo inteligente.
Por mais que tome tempo, o que se faz necessário é educar todo mundo, começando pelas mais altas cadeiras, fixando os fundamentos básicos, de modo que essas pessoas passem a dar o exemplo – que, afinal, não é a melhor maneira de educar de verdade, é a única. Esse processo de educação é um investimento necessário, e não um custo.
Concluindo
Um PMO não irá funcionar se for um lobo solitário dentro da organização. Se assim for, será uma jangada remando contra a correnteza, trabalhando sempre a duras penas até que uma hora seja sabotado ou simplesmente falhe por exaustão. Nesse momento, a chefia ignóbil vai demitir essa onerosa galera e terceirizar, crendo que comprando pronto não terá essa dor de cabeça. Decorrido algum tempo irá perceber que essa medida acabou custando mais caro e que os projetos não foram entregues do jeito que se pretendia, e então irá dispensar a terceirizada e recrutar novamente uma cambada para formar uma equipe de projetos. Mas não fará esforço nenhum para mudar a cultura das pessoas da empresa, e assim o ciclo se repete, empresas não evoluem e não amadurecem. Conforme tudo no mundo se acelera, os ciclos de vida desses PMOs ficam cada vez mais curtos, mas quando chega o momento de desmanchar o time e começar tudo de novo o chefe já mudou, foi demitido ou promovido... não importa mais, fica para o próximo que sentar na cadeira descascar esse abacaxi.
E é dessa maneira como um PMO não funciona. Agora, precisa ser sempre assim? Como é que faz para o bendito PMO funcionar, então? É simples: identifique as falhas nos processos aqui descritas e comece por corrigi-las, uma a uma. Assim já terá um PMO superior à maioria, com capacidade de tornar a melhoria contínua parte do dia-a-dia. Fácil, né? Então por que não acontece? Essa, meus amigos, é a pergunta. Quem achar a resposta primeiro, levanta a mão.
Autores : Fernando Henrique dos Santos com Gabriel Arruda
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Excelente artigo sobre a Gestão de Projectos. A realidade no terreno é quase sempre bem diferente da teoria. é importante analisar e melhorar continuamente a aplicação prática dos procedimentos teóricos.