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Foto do escritorJoão Correia Gomes

COVID-19: INDUZIRÁ À PRÓXIMA RENOVAÇÃO EXTREMA DA SOCIEDADE?

Nos últimos séculos, a humanidade beneficiou do progresso num ritmo ímpar na História. Após recuperar o saber clássico na Renascença, partiu-se da física de Isaac Newton e despoletou uma sequela imparável de eventos. Sem ciência nem tecnologia, não seria possível o progresso alcançado. Salienta-se o papel da engenharia que aplica a ciência e a matemática à realidade prática. Contribuiu a crescente interacção e inteligência colectiva, accionada em fluxos por novos meios de locomoção e comunicação, cada vez mais rápidos, eficientes e abrangentes.

Não se exclui a contribuição das estruturas institucionais, sociais e económicas, que se renovaram pela influência da tecnologia. É, por exemplo, o direito, um serviço público essencial que deve conferir confiança à sociedade.

Para medrar, a ciência moderna emergiu na Inglaterra do século XVIII pois oferecia um ambiente institucional favorável. Nessa Europa imperava a obscura ditadura de monarquias absolutistas e da Inquisição. Os países do sul da Europa regrediram imenso, apesar de beneficiarem da melhor situação à partida.

O progresso humano nunca foi pacífico. Para a expandirem e consolidarem, as várias revoluções industriais dependeram de infelizes conflitos sangrentos e globais que limpavam os ambientes estabelecidos.

É raro o poder e mentalidade já instalados aceitarem mudança. Esta afecta privilégios. A rotura surgiu quase sempre de eventos inéditos e inesperados.

A primeira revolução industrial inicia em meados do século XVIII. Baseou-se na máquina a vapor e da abundância do carvão mineral. A sua expansão beneficiou da revolução francesa que incendiou a Europa com ideias novas, gerando guerra (Napoleão) que destruiu os contextos instituídos. Emergiu um cadinho de nações europeias constitucionais, dependentes de impérios coloniais, que competiam ferozmente entre si.

Situação análoga aconteceu com a segunda revolução industrial que nasceu em meados do século XIX. A competição, com locomoção pelo comboio e navios a vapor, o telegrafo e a imprensa, facilitam novas descobertas e tecnologias. Mas a agressividade dos impérios leva ao conflito. A estrutura existente foi destruída com um brutal processo de morte, industrial, a primeira guerra mundial.

O conflito gera um novo ambiente favorável para as tecnologias emergentes, como as eléctricas e do motor de explosão. Agora são as nações que competem. Ganhou-se eficiência pela melhor comunicação e informação por telefone, rádio ou a gestão científica. Más decisões políticas em 1919 e o crash de 1929 levam à segunda guerra mundial. Este conflito apurou ainda melhor a produção de morte, mas também a criação de tecnologias inovadoras.

A terceira revolução industrial nasce neste ambiente competitivo de guerra. Por exemplo, a criação do computador (a partir da decifração da máquina enigma, destacando Alan Turing). O após segunda guerra decorre numa nova ordem institucional, social e económica. Expande-se o Estado Social, a classe média, os direitos das mulheres. Consolidam-se as tecnologias da segunda e progridem as da terceira revolução industrial. Todos beneficiam da melhoria dos fluxos devidos a redes de estradas, viagens aéreas, televisão ou exploração do espaço. A terceira revolução industrial consolida-se a partir do fim do Império Soviético. Os fluxos de informação aceleram em computadores disseminados por todos os lares e escritórios, ligados em rede pela Internet.


Um novo paradigma altera as estruturas sociais e empresariais, assim como o mundo se vê. A China emerge com a fábrica do mundo. Explode a globalização. Expandem o neoliberalismo e a democracia formal. Dispositivos electrónicos integram telefone e computador passam a estar no bolso de cada humano, e alteram de modo radical como se processa a inteligência colectiva. A quarta revolução industrial emerge com tecnologias radicais como a inteligência artificial ou a Internet das coisas.

As novas tecnologias operam em escalas ínfimas, ao nível do bit, átomo ou gene. Os efeitos sobre os ambientes em que existimos configuram ser muito mais potentes e abrangentes do que os conseguidos com tecnologias anteriores que operavam ao nível macro.


Se as revoluções industriais se reflectiram em conflitos ou revoluções sociais e económicas tão profundas nestes últimos séculos, quais serão os efeitos das novas tecnologias?


Como as anteriores revoluções, será que a quarta revolução industrial precisa de um novo conflito para consolidar?


O Covid-19 parece ser um ataque da natureza contra nós e, de modo análogo, atinge com vírus, uma toxina na escala micro! Se esta crise se prolongar muito então poderá equivaler aos grandes conflitos mundiais do passado, com profundos efeitos disruptivos na sociedade e a nível político.


Este será o tema do próximo artigo.

Lisboa, 24 de março de 2020

João Correia Gomes


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