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  • Foto do escritorJoão Correia Gomes

2021 É ANO PARA A (R)EVOLUÇÃO DA CONSTRUÇÃO?

Atualizado: 23 de mai. de 2021

“Dois dos mais poderosos motores da prosperidade económica, durante as últimas décadas, têm sido a globalização económica e a rápida introdução de tecnologias de automatização” (Acemoglu e Robinson, 2020).



Estes são os dois movimentos que tornaram mais eficientes os processos industriais. Nas últimas décadas foi possível retirar da pobreza extrema centenas de milhões de pessoas que integraram o sistema produtivo que disponibilizou tantos produtos a preços muito mais acessíveis. A automação transferiu para as máquinas a execução de tarefas simples, mas rotineiras, o que reduziu ainda mais os custos de produção.


Mais do que a exploração de recursos manuais ou automáticos baratos por todo o mundo, o maior efeito deve mais à revolução induzida nos processos produtivos, acelerada e só possível pela emergência de tecnologia como a Internet ou agora a Inteligência Artificial. A maior revolução tem sido a transformação digital e a gestão de processos inerentes. Neste movimento mundial, as empresas foram incentivadas a subcontratar e externalizar tarefas que antes eram produzidas (próximas no mercado nacional) quase sempre por estruturas de função e decisão internas, verticais e burocráticas, logo lentas e ineficientes.

A revolução informática libertou os fluxos de informação para fora do papel, desconstruiu as estruturas fechadas para sistemas em rede abertos, colados por informação que fluía na Internet. Ao libertar parte dos seus subprocessos tangíveis, os negócios poderiam concentrar-se nos seus atributos core (como patentes e segredos industriais); apostar na gestão logística dos fluxos de materiais, pessoas e informação; manter o controlo; apostar nas atividades intangíveis fáceis de reverter em bits e fluírem nos sistemas digitais.

Nas economias mais prósperas, os negócios passaram a concentrar a criação de valor em funções core como a gestão dos processos, o planeamento, o design, o marketing, o conhecimento (de tecnologia) ou o controlo. Estas funções captam o maior valor no negócio e menos as atividades subcontratadas e externalizadas, as quais têm de competir no preço, qualidade e prazo. A desmaterialização, informatização e até eletrificação dos processos está a alterar a cadeia de valor. Aposta-se em funções-margem, além das atividades mais tangíveis, mas são as que beneficiam a produtividade, eficiência e melhor atraem o necessário capital de investimento.


Perdem as economias (e parte da população operária) dependentes de modelos de produção, adormecidos na fraca formação e nos baixos salários, logo sujeitos a baixo valor acrescentado. Tendem a valorizar tanto as funções de conhecimento técnico (o que é baseado na ciência), criativas ou que requerem inteligência como as artes ou a matemática. A sua estagnação é agravada porque tendem muito atadas ao poder publico (que é quase despótico) e a redes familiares (apelidos genealógicos, partido, grupo restrito) restritas, mas pouco meritocráticas (Henrich, 2020). São economias que perdem.


E, Portugal, dispõe-se a mudar?

O país tem vantagens de elevado potencial. Apesar da desmaterialização, uma economia moderna continua a depender de plataformas físicas para a transação de bens e serviços. Precisa de humanos que sociabilizam e movimentam. Na pandemia que está a decorrer verifica-se que as pessoas não se prendem em casa durante 24 / 24 horas. Os humanos precisam de ambientes para viver. E, Portugal e portugueses, pela sua natureza, oferecem ambientes excecionais. É um trunfo.


O setor com função de fornecer ambientes físicos é o imobiliário (Gomes, 2018). Não se trata apenas de construir habitação para vender. Tal abordagem seria muito. O conceito deve evoluir, ser mais eficiente e assim contribuir para o notável crescimento económico. Mas, manter o modelo produtivo atual significa preservar a estagnação que existe há duas décadas. E não chega o lucro de alguns, poucos, pois tal não representa nada para a riqueza nacional.


Para a economia crescer e ser competitiva, o setor imobiliário e conexos terá de evoluir, pois é um setor indispensável. Hoje, o foco efetivo para a riqueza provem mais de fatores intangíveis (humanos, não substituíveis por máquinas ou computadores) do que a tradicional exploração dos recursos tangíveis – matéria prima ou a mão de obra barata, indiferenciada, substituível, mas quase sempre mal gerida. Acresce-se que o principal polo de criação de riqueza é a cidade, onde se concentra a inteligência e a criatividade produzida pela rede de cérebros humanos que interagem e se estimulam. As cidades são os espaços mais eficientes para gerir os fluxos que criam riqueza (pessoas, energia, conhecimento).


Os atuais modelos económico, institucional e processo de produção (de construção) não configuram os ambientes que proporcionam o progresso. A economia competitiva é a que inova, não permanece agarrada a dogmas e modelos já ultrapassados, na ilusão de que o mundo não muda. Mas, muda e muito. Para existir disrupção é preciso atrair jovens bem formados para as empresas e para as cidades onde devem ter os ambientes adequados para criar, estudar, investigar, desafiar, empreender. Para este fim, terá de se lhes atribuir responsabilidades (Ross, 2016), e cortar no stress e perdas inúteis de tempo (em transportes) que eliminam a ocorrência de tais atributos de valor. E terão de ser os jovens, como os mais desafiadores, com melhor formação tecnológica e que dão vida às cidades. É esta a vida própria que atrai os estrangeiros para viver numa cidade como Lisboa, uma fonte importante na procura residencial. Sem vida, a cidade não passaria de um resort turístico banal, logo barato.


Para este fim, o setor imobiliário deve encontrar soluções. Claro, as instituições terão de ajudar, supondo que o poder publico terá algum interesse em melhorar a economia, sem aplicar a mesma fórmula que amplia o setor publica, mas castiga o empreendedorismo. Por exemplo, pode abrir mão de terrenos seus (e não precisa de vender) ou aceitar melhorar as condições fiscais e legislativas compatíveis que atraia capital externo. Mas, o maior papel é do setor privado que terá de ser mais eficiente. Por exemplo, reduzir custos de produção de construção, demasiado caros, dependentes de processos produtivos arcaicos. E a redução do custo unitário de construção terá de acompanhar o aumento da remuneração da mão de obra para o sistema ser sustentável.


A produtividade e a eficiência não irão melhorar com os mesmos processos de construção ultrapassados que menosprezam o trabalho racional sistemático como o planeamento, o projeto ou a gestão. Ainda é corrente valorizar pouco o trabalho racional (que não se vê) e apostar mais no rápido avanço da obra tangível, mais fácil de medir. Todavia, atualmente, qualquer tarefa no mundo físico depende de informação para funcionar e ser executada. Os neurónios e bits já dominam os átomos e os genes (presentes nos músculos dos operários). A abordagem de software (e humanware) deve prevalecer sobre o hardware (como a construção tradicional).


Para ser viva, dinâmica, flexível e adaptativa, a unidade económica deve funcionar como um sistema aberto, o qual é composto por células (ou melhor, neurónios) interativos pela troca de fluxos de vários tipos. Num contexto em que as tarefas se interligam por instruções codificadas e contratos suportados por instituições, a produção física pode desligar-se do core de negócio. O empreendimento pode basear-se numa rede de parcerias entre unidades estratégicas de negócio que são independentes entre si, embora encetem e cumpram objetivos e regras comuns. As unidades ligam e desligam-se na rede conforme as oportunidades e necessidades dos projetos numa malha que tanto envolve o negócio como o cliente (figuras seguintes).


Atualmente, este tema é cada vez mais uma realidade concreta. A economia está a transformar-se numa rede de plataformas, digitais e físicas, que se interligam de forma tão fluída que os sistemas informáticos permitem. Trata-se da transformação digital que deverá atingir a construção de edifícios como é bem apontado nos seguintes artigos: “The Arc of Transformation: Preparing Construction for What’s Next” (Lepinoy, 2021); “Rise of the platform era: The next chapter in construction technology) (McKinsey, 2020)


O mundo económico mais próspero aproveita a Inteligência artificial e a Internet. As unidades estratégicas de negócio expressam-se através de plataformas que se interligam por todo o mundo económico. A produção dos bens físicos pode assim ser transferida para terceiras unidades fabris a montante da obra que apenas recebe a montagem do produto semiacabado (offsite construction).


Através da linguagem máquina, com software como o BPMN ou o DMN, pode ligar-se os fluxos (workflows) do processo de fabrico ao planeamento e projeto num ambiente virtual, muito mais eficiente, económico e ecológico. Permite-se limitar a quantidade de mão de obra que é substituída por máquinas e energia de fonte renovável aplicados em novos materiais. Exige inteligência racional e criativa, cola processos desde o plano de negócio à gestão do projeto, do design, a economia dos números, a contratação que certifica a confiança no empreendimento. O modelo induz a construção em escala, modulada, flexível e com muita informação. Pode transformar-se num sistema industrial aberto em todo o mercado composto por modelos de negócio como o IKEA, desde a conceção à entrega ao cliente.


Uma metodologia que contribui para esta mudança é o BIM que pode interligar a gestão, os projetos de negócio, a arquitetura, as diversas engenharias para a especificação do objeto virtual, composto por peças virtuais em bits com múltiplas dimensões, a ligar aos sistemas (máquinas e robôs) até à montagem do objeto físico em obra.



Lisboa, 15 de abril de 2021


João Correia Gomes


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